08 março 2008

item i - O Inferno


Os invejosos a ferver, ao centro, dentro de um caldeirão onde está um franciscano - um homem de Deus, um companheiro dos pobres.

Pelo orgulho pagam três mulheres, à esquerda, onde os seus cabelos são consumidos pelas chamas, estas sim do Inferno, que além de lhes queimarem a cabeça lhes fazem ferver o sangue que para lá desceu.

O avarento, obrigado a engolir moedas por um demónio, está à direita das infames orgulhas quasi sem cabelo. Pena apropriada para aquele que sempre quis o dinheiro para si. Se tanto o quer mais vale que fique dentro dele, parece ser justo... Ainda para mais não devia praticar a caridade que Deus Filho mandou que se fizesse e que os reverendíssimos bispos e os mais pequenos curas ordenam que se faça. Realmente "é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico para o Reino dos Céus"...

O que comeu e bebeu sem parar, sem respirar, com os dentes tintos do vinho, além do amarelo acastanhado habitual, e nos seus intervalos e plantados por bocados de carne pouco assada para que a pudesse engolir de imediato. A esse que pareceu um porco esfomeado enquanto esteve na Terra está um outro demónio a fazê-lo engolir vinho por um odre em forma de porco. É bem feito, e eu se alguma vez fiz o que este fez não mais o farei!!

Ao que sempre se zangou, intempestivo e agressivo, bravo, que não se lembrou da misericórdia divina, do perdão e até da calma, esse está a ser pingado!

A desavergonhada luxúria dos adúlteros bem como as outras aberrações que se dizem homens mas que dormem e beijam e tocam noutros homens, esses são manietados. Apenas se podem ver. Tocar não. A tentação tão perto, sente-se-lhe o cheiro, vêm-se-lhe as formas cinzeladas uns dos outros que os faz ficarem fora de si, quais cadelas no cio, as bocas ficam húmidas. Mas despertam de si, tentam acalmar a sua fúria de animal, e apercebem-se onde estão. Será um misto de medo com excitação.

Quem preside ao tribunal perpétuo é um demónio. Mas vejam que se veste como os bárbaros selvagens das Terras de Vera Cruz há tão pouco tempo achadas pelos nossos barcos que transportam a cruz de Cristo nas velas.
São homens de Deus os que vão, mas são homens do diabo os que encontram.
Serão estes índios, como o Colombo lhes chamou, demónios? Serão... Negam a Deus, comem-se uns aos outros e a animais que cá não se comem, são repugnantes e não aguentam trabalhar. É gente má com certeza. Poderão até ser obra do demónio para travar o brilhante caminho da glória dos vassalos d'el rei de Portugal.

O inferno deverá ser assim. Já antes os temia. Agora temo-o mais!

Seria isto que pensaria um homem, entrado numa qualquer igreja portuguesa pelos idos de quinhentos, e que visse este quadro?